Comecei a escrever essa edição no dia 07/01 e terminei dia 10/01.
Estou aqui, nos últimos dias de praia, onde, saturada de capitalismo e redes sociais, tento me desligar do virtual e viver no real. Pegar sol, ler meus livros, tomar umas cervejinhas e deixar as mágoas no mar. A meta era essa, mas, mais uma vez, a Meta estragou minha alegria, e, desde terça, a desconexão tem sido dificultada pelo assunto do momento, que não só dominou a internet como está em todos os jornais, inclusive no da manhã, que deixo falando sozinho ao fundo enquanto escrevo estas palavras na mesa que era só pra tomar café e, no máximo, rabiscar uns devaneios.
Eu só queria ter tempo para imaginar romances, descrever nos mínimos detalhes a areia da praia e o vai e vem das ondas, acreditando que a vida é boa, pelo menos enquanto estou de férias. Mas, como membro de uma sociedade que tem boa parte da identidade hospedada em plataformas digitais, estou aqui elucubrando sobre mais uma mudança temerária das desqueridas redes sociais e o que vai ser de nós depois disso.
Com toda a comoção, fiz o que tinha prometido não fazer e reinstalei os apps das redes sociais. Dois dias depois, posso dizer que não me ajudou em nada. O preço de me manter informada foi me pegar no flagra, manifestando e regando sentimentos negativos desde o primeiro piscar de olhos. Rotina que odeio, mas segui repetindo quase que automaticamente, mesmo depois de dias sem. Mas, afinal, essa é a internet de agora, não é mesmo? Algoritmos mobilizando afetos ruins para gerar engajamento e a gente caindo que nem patinho em troca de uma curtida, um elogio, um breve shot de dopamina para seguir o dia.
Não é de hoje que a insatisfação com a internet e a decepção de quem chegou aqui quando tudo era mato - sonhando com um mundo de livre navegação e descobertas - vem sendo explicitada através das mesmas redes que nos frustram e aprisionam. Não é de hoje que venho pensando se tem saída para essa armadilha em que ingenuamente nos enfiamos, com nós que apertam mais a cada vez que tentamos nos mexer. Entre criar e apagar perfis, desinstalar e instalar aplicativos, não encontrei qualquer resposta.
Sair da internet atualmente seria como sair do mundo, deixar de existir, algo que eu faria de muito bom grado se fosse herdeira. Mas, como pessoa que escreve e sonha em um dia “viver da sua arte”, não consigo imaginar uma vida em que eu não esteja aqui, brigando e reclamando, mas resistindo e sobrevivendo, mais por falta de alternativa que por vontade. É uma constatação triste, eu sei.
Já lembro com saudades dos primeiros dias da viagem, quando me permiti não ter ideia do que estava acontecendo com o mundo e viver dilemas que se limitavam a saber se iria para a praia ou ficaria só na piscina. “A vida é boa sim”, falei várias vezes, de tão relaxada, inebriada e alegre que estava. Agora, se aproximando o dia da partida, ainda digo, mas acredito cada vez menos, enquanto gradativamente vou ajeitando meu lugar no emaranhado de assuntos, opiniões e descontentamentos nesse oceano de tormenta que volto a frequentar cada dia mais.
Eu, que vivo e critico a experiência horrível que as redes da Meta oferecem há anos e sei que misoginia, LGBTQ+fobia e transfobia ali são mato, enquanto conteúdos progressistas são censurados sem pudor, não quero me juntar ao coro de pessoas que dizem que nada mudou com as declarações recentes de Zuckerberg. Porém, entendam: pode parecer que o pudor só deixou de existir agora que a estratégia foi verbalizada, mas o que acabou mesmo foi a farsa. Com um governo de extrema direita fundamentado no delírio de que os Estados Unidos são o centro do universo e que toda a humanidade deve se curvar a esse poder, não é mais necessário fingir que plataformas como Instagram e Facebook não nos vigiam 24h por dia e não manipulam nossa vida em troca de lucros exorbitantes.
O fim da farsa traz consigo o fim da sutileza, que dá lugar ao apoio descarado a ideologias opressoras, que colocam homens brancos, superricos e feios no topo da cadeia alimentar que devora direitos humanos, princípios democráticos e nossa alegria de viver. Assim como no ex-Twitter, a tendência é que não só o impulsionamento, mas a produção desses conteúdos cresça, incentivada pelo endosso dos donos da plataforma e pela rentabilidade gerada pelo tão cobiçado “engajamento”.
O que fazer então? Arrancar o fio do modem não é mais uma metáfora que cabe, visto que hoje temos a internet literalmente na palma das mãos. Morar no mato já fui, mas lá também tem wi-fi. Ou seja, não há como fugir, então o que acredito que resta é viver o luto do sonho impossível que criamos na mente.
Viver o luto sabendo que o novo sempre vem e que, mesmo nem sempre sendo um novo bom, a possibilidade de algo melhor ainda existe. Vi gente no Bluesky sonhando com mais uma suspensão judicial para o Instagram, como aconteceu com o X, e entendo totalmente o sentimento. Mas sempre fica aquela questão: por que temos que esperar? Eu sei, eu sei, capitalismo e tal… mas é importante lembrar que não estamos aqui só por necessidade.
Usar as redes, não deixar que as redes me usem. Tenho repetido muito esse mantra e lembro dele justamente nos momentos em que estou levando uma surra da internet que a gente não quer, jogando o jogo dessa gente ruim e fazendo exatamente o que esperam que eu faça. Por isso, dessa vez, não xinguei muito no Twitter, nem fiz um story para reclamar. Preferi sentar aqui e, ao longo dos dias, ir escrevendo este texto, de pouquinho em pouquinho, no tempo da Lívia, não no do algoritmo. Também me recuso a sumir ou silenciar, porque, se fazemos isso, aí é que eles vencem.
Não posso dizer que é uma estratégia perfeita, pois, como contei lá no começo, rapidamente me vi voltando para o automático. Mas é nessa hora que, pela milésima vez, me dou uma sacudida e retomo as rédeas da minha vida. É um jogo de cai e levanta em que escolho fazer aquilo que me agrada, que me dá uma sensação de propósito, que me deixa com menos impressão de estar chutando as paredes de um beco sem saída. Porque não, a internet não morreu, e provavelmente nós vamos morrer antes dela.
Nesse meio tempo, fecho o notebook e volto meu foco para a praia e para as férias, enquanto ainda posso. Usar, sim; ser usada, só quando for inevitável mesmo.
Por hoje é só :-)
Feliz 2025!
Feliz 2025, mais uma ano de luta, é assim mesmo, é uma luta, é um vai e vem, mas uma hora a gente cansa e se encontra, abração
Que bom que conseguiu pelo menos um tempinho pra "ficar off", amiga, ando sonhando muito com isso. De minha parte, deletar todas as redes é impensável, porque, como você disse, é quase desaparecer - no meu caso, as redes são meu meio principal de comunicação com todo mundo que eu amo. O que tenho feito é justamente o que você apontou, tentar estar mais atenta pra não ser dominada pelas redes, mas, ao invés disso, dominar eu como, quando e por quê escolho ainda estar aqui. De novo, é uma graça especial poder ler seus textos no Substack - tem sido meu lugar mais aconchegante. Acho que resistiremos, apesar de não saber exatamente como.
Vamos tentando...
Feliz ano novo! Há de ser melhor. Um cheiro ❤️