d-_-b Pra ler ouvindo essa playlist
Junho não teve newsletter. Eu tinha um texto pronto no rascunho, mas percebi que era pessoal demais e muito específico sobre algo que eu estava vivendo quando escrevi, decidi não enviar. Depois, jurava que tinha escrito algo pra cá no meu caderninho, mas quando folheei não encontrei nada que quisesse ou pudesse publicar. Não sei o que aconteceu, mas do tanto que escrevi o mês inteiro, a nossa cartinha não consegui escrever. Então tô aqui, já em julho, falando sobre isso pra introduzir algo que venho pensando muito ao longo desses últimos meses.
Viver é uma maratona. Fazer o que você gosta, encontrar seu lugar e seu propósito no mundo, aprender e colocar tudo isso em prática leva tempo, leva uma vida inteira e a vida, embora muitas vezes possa não parecer, é longa.
A gente vive num mundo que valoriza mais a explosão que a resistência (ou seria resiliência? ando tão cansada do uso que tem sido dado a essa palavra que já não sei mais onde realmente cabe). Um tweet de 240 caracteres que viraliza, vídeos de 15 segundos repetidos à exaustão no feed, stories que só duram 24 horas, notícias do dia que ficam obsoletas muito antes de servirem pra embrulhar o peixe da manhã seguinte. Não há tempo pra maturar os pensamentos, não há espaço pra cultivar uma ideia e esperar florescer. Tudo é agora, mas o agora não é tudo.
Ainda que eu passe um grande tempo sem publicar nada, eu escrevo todos os dias e todos os dias penso em novas coisas pra escrever. Sigo vivendo, produzindo pensamentos e reflexões e na maior parte das vezes não sei o que fazer com isso, principalmente quando não se encaixa na lógica do “viral”, quando leva tempo pra construir e acaba “perdendo o sentido” porque a pauta do momento já mudou (tão tão rapidamente).
Toda essa urgência causa a impressão de que a vida é curta e que toda chance é a última. Todo texto tem que ser um hit, toda forma de se expressar no mundo só vale a pena se surfar na onda que pode te elevar pra importante posição de influenciador de qualquer coisa e voltar os olhares pra você, mesmo que só por algumas horas, minutos, segundos…
A vida é efêmera sim, muito passa pela gente num piscar de olhos e o tempo é relativo ao que tá acontecendo no momento. Mas também é durável e precisa de maturação, desenvolvimento, solidez que só se alcança com a construção de uma boa base. Às vezes a gente precisa de uns dias pra perceber que aquele desabafo sobre aquela situação específica pode dialogar bem com seu coração, mas não comunica muita coisa pra quem te lê. Precisa de semanas pra desenvolver aquela reflexão que veio de uma notícia “bombástica” e transformar em pensamentos que valem a pena ser compartilhados.
Eu tenho me permitido gastar esse tempo, escrever as coisas erradas sobre os assuntos certos, estudar pra fundamentar meus pensamentos, ler, reler e reescrever parágrafos “geniais” que surgem no calor do momento. Mas na dinâmica dos dias atuais, a sensação é sempre de estar perdendo o trem, parada na estação, vendo ele passar. Um trem lotado de pessoas aos berros, cheio de ótimas ideias e também de repetição, de reciclagem dos pensamentos alheios, de palavras ao vento. Um ninho de mafagafos, difícil demais de desmafagafizar.
Não é fácil sacudir esses pensamentos e assentar na cabeça que estamos aqui pra uma corrida longa, que a vida não acaba agora, nesse texto, na última polêmica, no último post. É difícil ficar bem com os escritos que “não dão em nada”, que não são lidos o suficiente (seja lá o que isso for), que sequer são publicados. Se o trabalho invisível não fica visível, parece não que existiu, mesmo pra quem trabalhou.
Ao mesmo tempo, sinto cada vez mais necessidade de desacelerar e deixar minha cabeça assentar antes de compartilhar qualquer coisa. Esse ritmo que nos é exigido é exaustivo pra quem faz e pra quem consome. Caetano já dizia “quem lê tanta notícia?” e hoje podemos perguntar: quem vê tanto tweet, tanto post, tanto vídeo? Eu tento, mas não consigo. E não conseguir tem me dado uma nova perspectiva, tem me feito questionar mais. Eu preciso? Preciso saber de tudo, comentar sobre tudo? Não. Não preciso, não posso e não quero. Não mais.
A vida é uma maratona. A estrada é longa e a preparação é demorada porque é assim que tem que ser. Entender isso e aprender a não sofrer por coisas irreais e fugazes como curtidas e visualizações é algo que preciso fazer por mim. Gasta tempo, energia e esforço real pra subverter a lógica que te suga todos os dias nesse prolongamento da mão que é o celular. Estou na preparação, melhorando o condicionamento, pra seguir o mais tempo possível nessa longa estrada. Devagar e sempre.
viver toda espalhada é muito dolorido
quero me reunir, me encontrar, me juntar numa massa consistente e segura
quero ser adulta sem o pânico de cair do abismo o tempo todo
quero estar presente o suficiente pra saber que a vida não é só isso
(um desabafo de 01 de junho)
Miscelânea
Vi essa lista dos 10 melhores álbuns brasileiros da história no twitter e foi uma onda bem bacana escutar todos eles. Fica a dica.
Foi publicado um conto inédito da Lygia Fagundes Telles sobre a morte e olha, que lindo.
Afinal, o que há de mais belo na vida — na vida e na morte — é o mistério. Desgosta-me essa preocupação constante de se racionalizar realidade e sonho, deixemos de lado as lúcidas análises, quando eu digo nuvem, é nuvem mesmo. Quando eu digo montanha, é montanha mesmo e não outra coisa. Fiquemos apenas na interpretação primária, do entendimento até das criancinhas.
Entrei atrasada na onda de Pantanal e ainda tô atrasada porque, apesar da noveja ser bem boa, não tenho a menor paciência pro Jove. Mas teve uma frase ainda lá da fase inicial que mexeu muito comigo. Depois de perder a casa e os filhos, Gil tenta consolar Maria Marruá dizendo que ela vai superar, porque é forte, no que Maria responde:
Eu não sou forte Gil, sou sofrida.
Existe uma diferença muito grande aí que o mundo muitas vezes nos faz esquecer, principalmente quando se é mulher. Importante prestar atenção.
Novidades no Líviaverso
Essa seção chamava “Destaques no @liv.re_”, mas considerando a intenção (e ação) de expandir meus horizontes para além do Instagram, mudei o nome porque ultimamente, felizmente, eu tô ocupando outros espaços. Espaços importantes, mais livres, mais Lívia.
A primeira menção precisa ser sobre retornar ao Portal Catarinas com dois artigos de opinião sobre acontecimentos tenebrosos do último mês e a tentativa de trazer uma perspectiva feminista, reflexiva e abolicionista sobre isso:
Você suportaria ser torturada só mais um pouquinho? - sobre o caso da menina de 11 anos que teve seu direito ao aborto legal negado, foi afastada da família, torturada e coagida por uma juíza e uma promotora em Santa Catarina.
O feminismo punitivista é uma armadilha - sobre o que aconteceu depois desse caso, as tentativas de retrocesso em relação ao direito ao aborto e como o sistema penal trata as mulheres.
No feed do @liv.re_ tivemos um guia pra falar de violência contra a mulher sem reproduzir estereótipos machistas, uma breve explicação sobre as diferenças entre violência de gênero, violência contra a mulher e violência doméstica, uma cartinha de aniversário celebrando os 04 anos do perfil, um desabafo e um poeminha.
Na Transversais estamos apresentando Carolina Maria de Jesus e mostrando uma prévia das cartas do Memórias Transversais, que tá saindo do formo muito muito em breve.
Por fim, tem atualizações também no blog. Tenho usado o espaço pra escrever coisas que me dão na telha e também pra republicar alguns outros textos que estão espalhados pela vasta internet. Com tantos projetos rolando, o blog tá se tornando meu espaço seguro, meu refúgio, meu cantinho e eu gosto muito disso.
Querido diário
Quarta, 14 de julho de 2021
Há seis dias larguei meu caderninho e o controle da organização. Coincidiu com os primeiros dias dos medicamentos. Ansiolítico e antidepressivo.
Nesses dias eu produzi. Analisei uma série ruim, tive uma reunião promissora sobre o projeto dos jogos. Pensei, conversei, trabalhei, fiz alguma limpeza, cuidei da Ursinha. Mas deixei o controle de lado. E é sempre difícil voltar quando isso acontece.
Perdi metade da semana de brincar que sou escritora [referência a um exercício do livro “O caminho do artista”] e resolvi deixar pra semana que vem. Ou começar agora e fazer durar uns dias a mais, algo que acaba de me ocorrer aqui. Mas e se eu fosse escritora? Como seria?
Talvez fizesse como faço na vida das minhas incontáveis Sims com essa profissão: acordar, cuidar das necessidades básicas e tirar o resto do dia pra escrever. Praticar escrita. Escrever contos, poesia, fantasia, até chegar no nível de habilidade que me permita escrever roteiros, romances de mistério e biografias. Tudo tão linear, tão simplificado. É só preencher as barrinhas e depois passar horas digitando no computador. Talvez eu deva tentar.
Na vida real posso também ler livros, nesletters, artigos. Mas não tweets, não mensagens no whatsapp e stories no instagram.
Talvez eu me sinta tão fragmentada por viver de fragmentos. De texto, de tempo, de pensamentos, de histórias na TV.
Quero mais começo, meio e fim. Como o fim desse caderno e os tantos que vieram antes dele, com textos completos e fragmentos. É hora de costurar meus retalhos.
Fico por aqui. Se quiser continuar a conversa, clica aqui embaixo :). Até mais.
Sua Newsletter dialogou bastante comigo! Obrigada! E eu fiquei curiosa para ver seus caderninhos. Saber como usa, etc… curiosidades rs bjs e boa semana!